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Vídeo documentário sobre o Poro

Ações efêmeras. Ou seja, ações sutis. Delicadas ações que podem passar desapercebidas. “A pessoa bruta não liga pra nuance das coisas” (mautner). Pequenas doses de beleza em paredes, em folhas, enxurradas. Desde 2002 inventando intervenções nos espaços públicos, o Poro acaba de lançar o seu primeiro documentário. Produzido em parceria com a Rede Jovem de Cidadania, o filme de 22 minutos mostra várias das principais ações que o Poro vem desenvolvendo nos últimos 8 anos.

Para saber mais, é no blogue oficial do poro:
http://poro.redezero.org/video/documentario/

Da delicadeza ou o anel que tu me deste

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Mário de Andrade, lá no Losango Cáqui, dizia: “a máquina de escrever do meu mano foi roubada/isso também entra na poesia/porque ele não tinha dinheiro para comprar outra.

No dia 16 de outubro, minha amiga Cinthia Mendonça teve sua mochila roubada. O conteúdo: uma câmera fotográfica, um laptop, dois celulares que o fabricante havia cedido a título de empréstimo para a realização do projeto no qual está atualmente envolvida, além de outros objetos pessoais. Levaram objetos de valor financeiro contável, mas a memória contida ali dentro era de valor inestimável.

Viajante assumida, pode-se dizer que a mochila da Cinthia continha uma parte bem considerável de seus pertences. Sua chegada a BH inclui um certo desejo de pousar uns tempos por aqui. Chegou de Recife em julho deste ano. Participava do programa Interações Estéticas da Funarte, em colaboração com a lendária Lia de Itamaracá. Em agosto participou da MIP2 e performou o Sobreabismos numa das calçadas do viaduto Santa Tereza (ironia que a tenham roubado justamente embaixo desse viaduto, ressaltando ainda mais o abismo). Tudo ela ia registrando, transformando em novos projetos. Bons tempos os do Mário, em que o ladrão roubava a máquina de escrever mas não levava o que saía dela.

Foi a Cinthia quem me relatou do incêndio sobre as obras do Hélio Oiticica. Fiquei abismado, é claro, com tudo. Hélio Oiticia incendiado era para mim, à primeira vista, uma espécie de contra-revolução. Uma chacina. Tudo isso já foi muito dito. Quem soube do incêndio e recebeu a primeira informação, vinda do irmão do Hélio, de que 90% havia se perdido e depois não soube mais, lamentou a grosseria da cultura brasileira, despreocupada em manter vivas as descobertas e invenções dos seus melhores artistas. E, como sempre, é preciso lembrar do prestígio que gozam suas obras em outras partes do mundo, evocar o reconhecimento vindo de outros lugares que teriam de certa forma um poder de melhor legitimar a originalidade do nosso quase heliogábalo. E eu aqui pensando: “que pena que não são capazes de reconhecer por si mesmos o que está evidente diante de seus próprios olhos”. Conversando com a Cinthia, a gente concluía que um trabalho de arte, neste mundo em que vivemos, é muito delicado e pode ir para os ares como mera fumacinha, prestes a desaparecer na memória dos viventes.

Apesar da perda irreparável das obras de Oiticica (por mais que reformem), acabamos por achar que tudo não teria passado de uma auto combustão. Estamos falando de um artista que não queria inventar uma obra-artefato. Suas criações possuíam o caráter de projeto e ele propunha que elas fossem reproduzidas, refeitas, copiadas. A idéia foi mais ou menos comprovada quando, logo depois, César Oiticica encontrou os metaesquemas praticamente intactos.

Hélio é o deus sol do fogo e da justiça, um xangô grego: pode queimar o que bem entender. Mas acredito que o Oiticica quereria incendiar as mentes. Dar às artes uma dimensão menos estagnada e menos arraigada às leis do mercado e da academia. O incêndio (e o roubo dos objetos da Cinthia) não terão sido em vão se tiverem acendido o fogo dos questionamentos sobre arte, vida e memória. Se os artistas voltarem a querer entrar em todas as estruturas e explodir com elas. Agora, começam a aparecer aqui e ali pela web afora os vídeos realizados por e em torno à obra de HO (procurem no google). Se for este o rescaldo final do incêndio, agradecerei aos deuses sempre que puderem incendiar uma obra mais.

PERPENDICULAR – ações para museu

perpendicularmuseu: próxima quarta, 28 de outubro a partir das 19h

PERPENDICULAR vem se configurando como um projeto de ações artísticas que tem como intenção intervir no espaço instituído da arte e, também, ativar redes colaborativas de expressão que ampliem as relações entre instâncias fechadas.

PERPENDICULAR – ações para museu, acontecerá nos arredores do Museu Inimá de Paula.
Potencializando o espaço aberto que circunda o Museu e instaurando novas paisagens, o evento terá duração de 3 horas. No momento, o Museu Inimá de Paula expõe Vik Muniz.

As ações acontecerão na Rua da Bahia – entre Alvares Cabral e Augusto de Lima. Avenida Alvares Cabral – entre Bahia e Augusto de Lima e arredores – CENTRO de BH.

*Para mais informações: www.perpendicularmuseu.blogspot.com

Ocupação Paulo Leminski

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Em São Paulo está acontecendo desde o dia 1º de outubro a Ocupação Paulo Leminski. Com a curadoria de Ademir Assunção, a exposição parece estar bem ampla, trazendo cadernos, rabiscos, vídeos, músicas, frases, muita poesia do “cachorro louco” de Curitiba, além de uma programação especial com espetáculos cênicos . Pelas fotos que vi lá no blogue do Ademir, parece que está muito bonito e eu gostaria muito de estar em Sampa nesses dias para poder ver de perto.

A exposição acontece no Itaú Cultural, ali na Avenida Paulista e vai até o dia 08 de novembro. Para ter uma palhinha, você pode ir ao site: www.itaucultural.org.br/ocupacao e ouvir alguns testemunhos (indicado ver em computadores potentes).

Autofagia + Ruah! + Pigmentos Sonoros +

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Pigmentos Sonoros – Uma homenagem a John Cage

Benjamin Abras e Leo Gonçalves lançam o Coletivo Ruah! na performance Pigmentos Sonoros no próximo dia 10 de setembro, a partir das 20h no lançamento da Revista de Autofagia 2 e 3, no Auditório da Escola Guignard.

Apresentação poético-musical baseada em pesquisas ritualísticas, explorando ritmos e sons vocálicos. Para a performance, o coletivo ruah! aproveita estruturas sonoras primitivas onde a desconstrução leva à re-significação das palavras (ou não-palavras).

A proposição “Pigmentos sonoros” surgiu do intuito de homenagear o compositor-poeta John Cage, que no último dia 05 de setembro completaria 97 anos e da intensa interlocução interartística estabelecida em 2009 entre os dois poetas que compõem o coletivo ruah!

Salpicar os sons, desmantelando palavras do sentido roto, ampliando sua corpografia através do canto onde, tom sobre tom, imprimem no corpo o matiz de uma vontade pela vibração das palavras. A palavra retomando corpo, retomando som como paramento de um instante, onde o jogo “vocográfico” desenha possibilidades poéticas entre os falantes, os ouvintes e os dançantes. Sugerindo uma pequena parafernalização dos sentidos [salve Julius], a fim de despertar a ação da palavra enquanto produtora de corporalidades sutis. A performance Pigmentos Sonoros é um experimento do coletivo RUAH!, feita com registros de som e silêncio dentro da poesia sonora, ritualizando a desconstrução da realidade cartesiana e produzindo uma experiência da voz enquanto escrita corporal.

O coletivo ruah! é formado por Leo Gonçalves e Benjamin Abras. Tem como objetivo a investigação, a experimentação e a execução de trabalhos pluriartísticos em plena interação com as tradições mestiças que habitam o planeta.

Lançamento da Revista de Autofagia

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No dia 10 de setembro serão lançados os números 2 e 3 da Revista de Autofagia. O esperadíssimo evento (eu pelo menos, que colaborei no número 3 com traduções de Allen Ginsberg, esperava ansiosamente) acontecerá no auditório da Escola Guignard a partir das 20h. Na programação: debates, leitura de poesia e performances, exibição de vídeos e artes plásticas.

Eu estarei lá, com (entre outras coisas) o lançamento mundial da performance Pigmentos Sonoros, o primeiro resultado da investigação poético-antropológico-musical que venho realizando em parceria com Benjamin Abras.

Aguardem mais novidades pela semana afora.

MIP2 – Sobreabismos

 

viaduto santa tereza

Quem já ouviu falar do viaduto Santa Tereza, pode pensar que se trata de uma obra prima da construção civil. Mas não é. É apenas um dos muitos lugares inóspitos da cidade, construído originalmente para a travessia de carros e pedestres. Não é longo: caminhando com calma, pode-se atravessá-lo em 10 minutos. Seus famosos arcos e os postes antigos que o iluminam dão-lhe um ar pitoresco, e pode ser animado pela imensa faixa de céu que se abre acima, o sol que se esconde à esquerda, atrás da praça da estação, e a feia linha do metrô que passa por baixo. Também passa embaixo o rio Arrudas que, de tão feio e fedorento, foi coberto de cimento e asfalto. Olhando na extremidade que está conectada ao centro, vemos muitos prédios. E por todos os lados, asfalto e tráfego. Embora por ali passe sempre muita gente, sua função é a de unir os bairros da região leste de Belo Horizonte ao centro, garantindo o tráfego funcional do município.

A proposição se chama Sobreabismos. Duas bacias dispostas lado a lado em cada extremidade da calçada direita. Em uma delas, água. Na outra, uma combinação de pigmentos que lembram algum minério extraído das minas gerais. A performer Cinthia Mendonça pisa na bacia com água, molha bem os pés descalços e depois se deixa sujar com o pó amarelo-avermelhado da outra bacia. Segue então seus passos até o outro lado da ponte. O trabalho, que faz parte da programação da MIP2 (Movimentação Internacional de Performance), teve seu início na sexta-feira, dia 07 de agosto às 14h e foi até o pôr do sol. No percurso, observações, contatos humanos, encontros previsíveis e imprevisíveis, diálogos, descobertas, um rastro colorido no chão e a teimosa vontade da artista de ser elo entre os dois lados do incontornável precipício que habita o indivíduo da cidade grande.

Às 16:30, começa outra performance, desta vez na praça da estação. Durante duas horas e meia, o grupo Xepa realiza a Edificação: muros construídos com tijolos limpos cor laranja. Os tijolos, encaixados um por um pelos performers, não levam cimento e são colocados num ângulo levemente deslocado até o ponto de cair. Por alguns instantes, a simbologia de dureza e rigidez é forçada ao ponto de tornar-se movimento. O resultado final é um conjunto de esculturas-instalações que fazem da cinzenta praça um lugar apocalíptico e colorido por onde o passante pode sentir que está ou entre barricadas ou no meio de um quadro surrealista. Infelizmente, por questão de tempo, só pude ver esse trabalho no momento em que os realizadores já não estavam presentes. Mas, enquanto passava por ali, por volta das 19h, por entre as muretas caídas e abandonadas, ainda pairavam no ar algumas reflexões.

A palestrante portuguesa Suzana Vaz, comentou a idéia de Joseph Beuys de que “todas as pessoas são artistas” para concluir algo mais ou menos assim: “Quanto a mim, acho que a maioria das pessoas atualmente sofre de uma certa normalpatia que as leva a não entender nada que não caiba nos moldes do sistema consumista. É claro que essa minha opinião não está livre de discordâncias, mas assim é como eu vejo”.

Em Belo Horizonte, nesta época do ano, o sol se põe antes das 18h. Nesse horário, o centro está repleto de pessoas que vão e vêm em busca das conduções que as levarão de volta para casa. Na praça da estação, especialmente, há muitos pontos de ônibus que levam até os bairros mais periféricos da cidade. É realmente um grande e rápido fluxo de gente. E, exatamente por esta razão, uma operadora de telefonia móvel resolveu instalar ali um ruidoso balão dirigível vermelho com a notícia de sua mais nova promoção, eclipsando as Edificações do Xepa. E, enquanto eu caminhava pela populosa praça, onde as pessoas não podiam deixar de olhar para o imenso outdoor que a todo momento ameaçava alçar vôo, eu sentia a melancolia de quem anda sobre abismos. Os mesmos e incontornáveis abismos que distanciam de ações propositivas como estas e muitas outras que participam da MIP2, as imensas procissões cotidianas do consumismo e da normalpatia.