Arquivo da tag: poesia

Seu nome – Fabrício Corsaletti

Ouvir o Fabrício Corsaletti falar seus poemas na Casa das Rosas dia desses foi uma das gratas surpresas com poesia em São Paulo. Perguntado sobre os poetas contemporâneos que ele mais admira, falou de Angélica Freitas para quem escreveu “Pobre Angélica Freitas”. É muito bom ver esse ar de despretensão numa poesia tão densa. Fico feliz que seus livros estejam saindo hoje por uma grande editora, a Cia das Letras.

Londrix 2010

Começa na próxima terça-feira, dia 21 de setembro o Londrix 2010 – Festival Literário de Londrina. Seis dias de intensa programação. Poetas, escritores, música, feira de livros, lançamentos, debates, oficinas, palestras e a presença de muitos  amigos. Quem estiver passando por lá, não devia perder.

Pra saber mais, é no site:
www.festivalliterariodelondrina.com

Modelos vivos – Ricardo Aleixo

O esperadíssimo Modelos vivos, novo e recheado livro de poemas de Ricardo Aleixo, já se encontra disponível.  Chegou até aqui com um time de especialíssimo de amigos: o próprio Ricardo pilota a lírica, claro. No projeto gráfico, o camarada Bruno Brum. E o editor, Oséias Silas Ferraz, da editora Crisálida. Uma beleza.

O lançamento em Belo Horizonte será em duas etapas:

1) Dia 11 de setembro a partir das 11 horas no Café com Letras (Rua Antônio de Albuquerque, 781 – Savassi)

2) Dia 14 de setembro, às 19h30, também no Café com Letras. Ricardo Aleixo apresenta sua leitura-concerto Música para modelos vivos movidos a moedas e abre uma pequena exposição de poemas visuais de sua autoria.

Se eu estiver em BH, quem quiser me ver nos referidos horários, apareça lá. E tomara que role logo um lançamento em São Paulo. Quando houver, aviso.

Saiba mais no www.jaguadarte.blogspot.com

Poemas do Haiti no Suplemento

A edição de junho/2010 do Suplemento Literário de Minas Gerais estampou alguns poemas que traduzi do poeta haitiano Léon Laleau, um dos que mais admiro na língua francesa. Bem pouco conhecido, Laleau escrevia com ironia e bom humor.

O número 1330 do Suplemento traz ainda a participação de dois amigos: o Cleber Araújo Cabral, que, em parceria com Adriana Araújo Figueiredo, fala do escritor mineiro Wander Piroli, e o Eclair Antônio Almeida, que fala sobre e traduz Maurice Blanchot. E tem também poemas, contos, ensaios.

Para quem não sabe, o Suplemento é uma publicação do governo de Minas Gerais e agora é bimestral. A distribuição é gratuita, tanto na forma impressa quanto na virtual, que fica disponível no site da secretaria de cultura do estado. Quem quiser baixar o pdf, é só clicar aqui (ou na capinha do suplemento aí acima).

Poesia como arte insurgente

Acabo de ler um great little book. Poetry as Insurgent Art, de Lawrence Ferlinghetti, é um desses livrinhos para se colocar ao lado do travesseiro e ler uma frase por noite. Ou então, das famosas “obras para obrar” deixadas no banheiro no lugar das revistas de fofoca, esperando aquele momento mais íntimo dos seres humanos civilizados. Frases curtas e espertas. Pequenos instantes de veneno anti-mediocridade.

Há muito tempo que eu ensaiava um meio de tê-lo em mãos. Havia visto no site da editora City Lights em 2008 e, desde então, venho tentando imaginar o que o velho Ferlinghetti anda aprontando. A proposta Poesia como arte insurgente é sonhadora para esses tempos em que a linguagem anda sumindo. Estava super afim e pensava em pedir via internet. Outro dia, passando por uma livraria de São Paulo, o encontrei e fiquei tremendo como um viciado com a vontade de adquirir meu exemplar.

Segundo os editores, Ferlinghetti tem certa aversão a tratados de poética. No entanto, este livro vem sendo escrito e reescrito ao longo dos últimos 60 anos, em sucessivas edições recheadas de acréscimos. Já teve também outros nomes. What is Poetry é o título anterior. Contém formulações de quem, ao longo do tempo, vem mantendo uma permanente confiança no poder das palavras e da poesia enquanto vida e subversão. Uma ideia fora de moda e atualíssima ao mesmo tempo. Coincide com questões que andam em pauta no Brasil e no mundo.

Veja-se por exemplo a exortação “Don’t make poetry by the Pound”, dificílima de traduzir sem variantes para o português, podendo significar “Não faça poesia pelo Peso”, em primeira instância. E na sequência: “Não faça poesia pelo dinheiro” (Pound esterling, a moeda inglesa). E por último: “Não faça poesia pelo Pound”. Quem leu meu artigo “Para acabar com o juízo dos críticos” sabe do que estou falando. Para o ambiente brasileiro, com seus poetas literatureiros, tem também esta: “Compose on the tongue, not on the page” [Componha na língua, não na página]. E: “Poetry is the real subject of great prose” [Poesia é o verdadeiro assunto da grande prosa]. E ainda: “Be a songbird, not a parrot” [Seja um passarinho cantador, não um papagaio].

Lawrence Ferlinghetti é um dos poucos poetas do mundo contemporâneo (talvez eu devesse dizer: do “meu” mundo contemporâneo, já que não conheço todo o mundo contemporâneo) a se interessar pela dimensão micropolítica da linguagem e explorá-la em sua obra. Suas idéias coincidem com as minhas mais recentes concepções sobre poesia. Veja-se a exemplo o aforismo-notícia que está na página 59 do livreto: “The war against the imagination is not the only war. Using the 9/11 Twin Towers disaster as an excuse, America has initiated the Third World War, which is the War against the Third World. [A guerra contra a imaginação não é a única guerra. Usando o desastre das Torres Gêmeas do onze de setembro como desculpa, os Estados Unidos iniciaram a Terceira Guerra Mundial, que é a Guerra contra o Terceiro Mundo]”.

Para os que não conhecem Ferlinghetti, ele é o autor de Um parque de diversões na cabeça, que foi reeditado recentemente pela LPM, na coleção pocket. No Brasil ele foi traduzido por poetas como Paulo Leminski, Leonardo Fróes e Nelson Ascher. É um dos poucos sobreviventes da geração beatnik no século XXI. Segundo Claudio Willer (em seu recente livro Geração beat): Ferlinghetti nasceu em Nova York em 1919, filho de um imigrante italiano e criado em Strasbourg, na França. Escrevia desde muito jovem, antes mesmo de servir ao exército americano. Participou da segunda guerra mundial como oficial da marinha, o que consolidou suas convicções pacifistas (Dare to be a non- violent poetic guerrilla, na anti-hero [Ouse ser um guerrilheiro poético da não-violência, um anti-herói]). Estudou em Columbia e na Sorbonne e, ao voltar para os EUA, fundou a editora City Lights no começo dos anos 1950. Publicou, entre muitos, Antonin Artaud e Jacques Prévert. Foi o editor da primeira edição do Howl de Allen Ginsberg (aquele poema que não precisou ser publicado para ser preso pela moral e os bons costumes norteamericanos). Sua editora é ainda hoje uma das forças que mantêm a inteligência ativa no país dos Walt: Whitman e Disney.

The Nort Pole is not where it uset to be. O Polo Norte não está mais onde costumava estar.

If you would be a poet, create works capable of answering the challenge of apocalyptic times, even if this means sounding apocalyptic. Se você quer ser um poeta, crie obras capazes de responder aos desafios dos tempos apocalípticos, mesmo se isso soar apocalíptico.

If you call yourself a poet, don’t just sit there. Poetry is not a sedentary occupation, not a “take your seat” practice. Stand up and let them have it. Se você se diz poeta, não sente-se simplesmente ali. Poesia não é uma ocupação sedentária, não é uma prática de “tomem os seus assentos”. Levante-se e deixe que os outros façam isso.

If you would be a poet, invent a new language anyone can understand. Se você quer ser um poeta, invente uma nova língua que qualquer um possa entender.

If you would be a poet, speak new thruths that the world can’t deny. Se você quer ser um poeta, diga novas verdades que o mundo não possa negar.

Reinvent the idea of thruth. Reinvente a idéia de verdade.

Unless you have an urge to sing, don’t open your mouth. A menos que tenha uma urgência de cantar, não abra a sua boca.

Make it more than “spoken word” poetry; make it “sung word” poetry. Faça mais do que poesia palavra falada; faça-a uma poesia palavra cantada.

Like a field of sunflowers, a poem should not have to be explained. Como um campo de girassóis, um poema não pode precisar ser explicado.

Don’t be so open-minded that your brains fall out. Não tenha a cabeça tão aberta a ponto de seu cérebro cair.

If a poem has to be explicated, it’s a failure in communication. Se um poema tem que ser explicado, há um falha de comunicação.

Whatever a poet says about his work is an apology he shouldn’t make. O que quer que um poeta diga sobre sua obra é um pedido de desculpas que ele não deveria fazer.

Art is not Chance. Chance is not art, except by chance. Arte não é Acaso. Acaso não é arte, exceto por acaso.

Cultivate dissidence and critical thinking. First thought may be worst thought. Cultive a dissidência e o pensamento crítico. Primeira idéia pode ser a pior idéia.

Resist much, obey less. Resista mais, obedeça menos.

Poetry is all things born with wings that sing. Poesia é todas as coisas nascidas com asas que cantam.

Don’t let them tell you poetry is for the birds. Não deixem dizerem que a sua poesia é para os passarinhos.

Don’t ever believe poetry is irrelevant in dark times. Jamais acredite que poesia é irrelevante em tempo escuros.

Don’t let them tell you poets are parasiti. Não deixe dizerem que vocês poetas são parasitas.

The poet sees eternity in the mute eyes of all animals, including men and women. O poeta vê a eternidade nos olhos mudos de todos os animais, incluindo homens e mulheres.

Poetry a naked woman, a naked man, and the distance between them. Poesia uma mulher nua, um homem nu, e a distância entre eles.

Poetry is not all heroin horses and Rimbaud. It is also the powerless prayers of airline passengers fastening their seatbelts for the final descent. Poesia não é só cavalos de heroína e Rimbaud. É também os passageiros sem poder das linhas aéreas fazendo orações ao colocar os cintos de segurança para a derradeira descida.

outro poema de m. dolabela

Asilo Arkham (Redundância #2)

a Paulo Leão

mudamos de casa
mudamos pra casa ao lado
mudamos pra galeria em frente
mudamos pro Bairro da Saudade
mudamos pro Cemitério da Paz
mudamos do Curral del Rey

mudamos pro andar de cima
mudamos pros fundos
mudamos a cor do cabelo
mudamos de ramo
mudamos de telefone
mudamos e não te convidamos

mudamos de sexo
mudamos de droga
mudamos a roupa de cama
mudamos a mobília da sala
mudamos pro Asilo Arkham
mudamos enquanto era tempo

mudamos o canal de TV
mudamos a faixa do rádio
mudamos de idéia fixa
mudamos a página do livro
mudamos de ilusões perdidas
mudamos pra melhor atender

mudamos e compramos dólar
mudamos porque o mundo gira
mudamos porque a lusitana roda
mudamos de medicação
mudamos o pó de café
mudamos e passamos o ponto.

(BHZ 29 jul. 2000)

Bibliografia:
Marcelo Dolabela. Lorem Ipsus: antologia poética & outros poemas. BH: edição do autor, 2006

um poema de marcelo dolabela

Baladilha à maneira de W. M.

eu tenho mais versos pra escrever
que dor ou arrependimento
se tu me dizes que me amas
penso sempre em fingimento
mas se berras que me odeias
eu tenho o mesmo sentimento

eu tenho mais boca pra comer
que dente sal e alimento
se eu não divido minha cama
é porque adoro o relento
e quando serves a ceia
prefiro um outro argumento

pois eu tenho mais versos pra escrever
com o nanquim do meu tormento

Marcelo Dolabela. Lorem Ipsus: antologia poética & outros poemas. BH: Edição do Autor, 2006