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Lambe-lambe no xerox

Sou um entusiasta do DO IT YOURSELF. Mais do que apenas fazer você mesmo, também me empolgo com o DO IT YOUR WAY, faça do seu jeito.

Isso me faz lembrar o quanto foram importantes para mim as ondas da poesia marginal, que me chegaram em plenos anos 90. Belo Horizonte tinha cheiro de mimeógrafo. Já não era tanto pelo projeto “marginal”, mas muito mais pelo “DO IT YOURSELF”, os poetas animados a fazer o que era de se fazer sem esperar apoios, governos, editores. Sintomaticamente, boa parte dos poetas com quem eu convivia era punk ou ex-punk. Era exatamente como eu ouvi o Marcelo Dolabela dizer em maio: uma nova geração de poetas, com outra influência da poesia marginal, com outra influência do Leminski, com outro olhar sobre a utopia. Dos que mais me envolvi naquela época estão o Marcelo Companheiro e a turma dos Dragões do Paraíso: Renato Negrão, Paulinha, Daniel Costa, Tati Tavares e os inesquecíveis saraus na Casa Rosa, o bar da Inês. A anarquia era a prova dos nove.

Há duas semanas, durante a Flip, decidi fazer eu também o meu panfleto. Lambe-lambe é um desses projetos que você topa fazer para experimentar. Com tiragem super pequena, posso alterá-lo, revisá-lo a cada nova edição. Pode ser que mude de nome, pode ser que mude algum poema, quem sabe o design, quem sabe os desígnios. Lambe-lambe é só o começo da história. Um jogo. Feita a tiragem, nada me impede de continuar preparando meu próximo livro, cujo nome pretendo também abandonar.

Depois de xerocado e grampeado é que fui me lembrar de onde eu havia emprestado o nome. “Lambe-lambe” é um poema da Ana Ramiro de que gosto muito (um beijo, Ana!!!). Quase um manifesto para mim. Já o meu Lambe-lambe são poemas com cuspe, tonta manifestação política. Poemas de amor de um projeto abandonado, mas não esquecido. É o meu LET’S DO IT, façamos. MY WAY nesse Lambe-lambe é a procura de uma fala urbana que penetre em tudo o que se faz, em tudo o que se vive. Cartazes nas vigas do Minhocão. Fotógrafo de praça. Pirulitos. Língua de fora de tanto perder tempo tentando fazer sentido. E estranhos vendedores ambulantes que te abordam com uma pergunta indiscreta, a propósito da mercadoria que têm em mãos: “Você gosta de poesia?”

Não foi só da Ana que fiz empréstimos: o principal e quem me lançou o mote foi o Chacal, ao me mostrar seu folheto Subversão, no qual reúne poemas éditos e inéditos [“Pessoas físicas são livres/para seguir seu caminho/sempre ao sabor do vento”]. Um projeto simples que, para mim, veio como uma lição de mestre. O livreto dele, feito no xerox, com pequenas colagens e posicionamentos políticos extremamente necessários nesses tempos de caretice crônica e poucas apostas est-éticas. “Voltando às origens”, ele disse.

Flip on / Off Flip

Foto: Eliane Torino

Ir à Flip, participar de conversas e encontros interessantes, foi uma grande surpresa nesse reviravoltoso 2011. Não esperava encontrar por lá tantos avistamentos, pessoas e encontros memoráveis. Os caminhos que me levaram para lá, a parceria com o Clube de Autores, meus questionamentos e a escolha esperançosa das concessões a fazer, se é que se deve conceder. Comento.

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Não se pode negar que a Flip se tornou o mais glamoroso evento literário do país. Nenhuma bienal foi capaz de superar a imensa atenção-tensão que gira sobre o mercado livreiro durante a Flip. Oswald de Andrade, no entanto, certamente revirou no túmulo. O homenageado deste ano, foi transformado em perfumaria. Antropofagia para madames, polêmicas insossas. Da birra de Antonio Tabucchi ao esnobismo de Claude Lanzmann, não rolou nada que desfizesse o clima de novela das 7. Frases panos quentes como a de Antonio Cândido: “Oswald não era nenhum bicho papão” (que a mídia gostou tanto de repetir), são exemplos do esquema publicitariocêntrico, cujo objetivo é agradar a quem não se levantou do sofá e obter alguma suposta eficácia publicitária cocacola. Literatura mesmo, a inquietude que existe por detrás de toda arte, o mal estar causado pelo surgimento de um novo livro, autor ou ideia, como foi a antropofagia de 1928, tudo isso fica para algum parágrafo distante, periférico.

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Em todo caso, “a alegria é a prova dos nove”. Nas idas e vindas, encontrei-me com o poeta Chacal, o que rendeu inclusive uma volta à tradição do mimeógrafo e do panfleto dos anos 70, muita reflexão e vontade de agitar. Já já falaremos disso. Saravá, Chacal! Ogum iê.

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Quem quiser ir a Paraty na próxima Flip já deve ir pensando principalmente no que rola na Off Flip. A Flip principal, com suas tendas, acontece nas margens do rio, próxima ao pontal, num perímetro pequeno demais da cidade. A festa é fechada para alguns poucos. Custa R$ 40,00 a entrada para ver os astros da literatura ao vivo e a cores. Há uma opção alternativa: os astros podem ser vistos a R$ 10,00 num telão instalado numa tenda vizinha. A alternativa da alternativa é assistir a esse telão do lado de fora da tenda, o que não é nada mal, já que, estando do lado de fora, também não se perde a vista exuberante onde o rio se encontra com o mar.

Mas festa, festa mesmo acontece no bairro histórico: com uma programação intensa e quase 24 horas, aqueles de pés animados podem visitar saraus, debates, trocas de ideias, mesas de bares, experiências literárias gratuitas e degustações inesquecíveis. É a Off Flip, organizada pela Lia Capovilla, a Luiza Faria e várias outras pessoas que trabalham com muito entusiasmo e, lamentavelmente, pouca grana (como tudo que-é-bom-e-poderia-ser-bem-melhor-no-Brasil). É na Off Flip que você assiste ao sarau da Cooperifa, às palestras do Clube de Autores, o sarau Picareta (projeto de Caio Carmacho) no meio da rua com a presença de Mano Melo, Chacal e muitos outros. Na Off, eu encontrei os poetas maloqueiristas empolgadíssimos falando tudo tudo o que vem à mente. Solos de sax, palestra sobre agricultura orgânica, o sarau na casa do príncipe.

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Depois da Off Flip vai demorar para este salamalandro que vos fala colocar todas as coisas no seu devido lugar.