“traduzir é inumano. nenhuma língua ou rosto se deixa traduzir.”
Juan Gelman
A arte da tradução é a arte do impossível. Cada língua e cada lugar possuem suas particularidades, seus próprios recortes da matéria viva chamada “realidade”. Se traduzir é um desafio já no ponto de partida, o desafio da tradução poética e suas correlatas em prosa se avizinha às artes do impossível.
A proposta desta oficina é, portanto, a de realizar experimentos com tradução de poesia, explorando, no ato tradutório, as subjetividades e os elementos de linguagem próprios da poesia. A experiência com a tradução nos permite explorar, para além da própria tradução em si, as inúmeras possibilidades e técnicas de criação poética, bem como as reflexões sobre o que pode um poema.
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Os tempos atuais requerem uma percepção que ultrapasse os limites do que está ofertado para os observadores que somos, sempre muito passivos diante das notícias e informações que nos chegam do mundo. Adotamos visões superficiais e descarnadas sobre outros povos e outros lugares. A relação que cada indivíduo do planeta estabelece com os outros lugares e povos liga-se sobretudo, às paisagens. Compreender o que ocorre no ver e no sentir de um povo diferente é abrir-se para o novo, tal como o é também a leitura do poema.
Cada poema numa língua estrangeira é como um rosto distante que nos olha sem que compreendamos o que ele quer nos dizer. Trazer para a nossa língua o dito e o não dito de um poema, é parte dos grandes desafios do mundo atual. É pensando nisto que o filósofo martinicano Édouard Glissant desenvolve seu conceito de plurilinguismo: não se trata de saber vários idiomas, mas de “escrever em presença de todas as línguas”. A consciência de que o poeta habita um mundo onde também existem incontáveis línguas diferentes da sua compõe também o poema, nesses tempos de mundialização que é também massacrante, mas não só: é também a oportunidade do encontro e de um diálogo inédito entre os povos do planeta.
Traduzir poesia é também, por outro lado, momento de lazer. Despreocupar-se dos problemas do mundo para debruçar-se sobre as palavras, seus ritmos, seus jogos, seus interstícios. Buscar compreender o que ela diz e o que não diz. Mas também: dizer o que se compreende e o que não se compreende.
José Paulo Paes, um dos melhores e mais profícuos tradutores brasileiros em seu tempo, dizia traduzir porque não entende o original. Traduzir é o melhor modo de descobrir o que está oculto por trás das palavras de um poema escrito em outro idioma. Outro tradutor fundador, Augusto de Campos, declarou certa vez que traduzir é um modo de tornar-se outro, como fazia Fernando Pessoa com seus heterônimos. Sentir pelas palavras do outro, trazendo-as para a língua portuguesa. Guimarães Rosa dizia que toda escrita é uma espécie de tradução: quem escreve traduz de um lugar inaudito coisas sem nome. Mas para Robert Frost, “poesia é o que se perde na tradução”. Eis o desafio.
Grandes poetas traduziram: de Gonçalves Dias a Haroldo de Campos. De Machado de Assis a Clarice Lispector. De Álvares de Azevedo a Manuel Bandeira. De Carlos Drummond de Andrade a Sebastião Uchoa Leite. E a lista não tem fim.
Traduzir poesia é (pode ser) um modo de experimentar. Um modo de dar respiro às palavras de um autor. Seguindo o pensamento de Juan Gelman: “Traduzir é inumano. Nenhuma palavra ou rosto se deixa traduzir. É preciso deixar essa beleza intacta e colocar outra para acompanhá-la: sua perdida unidade está adiante.”
A proposta de “Como traduzir um rosto” seria, portanto, esta outra forma de se fazer poesia. Um processo. Um procedimento.
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Há tempos espero o momento de realizar esta oficina. Estou contente com a oportunidade oferecida pela PBH. “Como Traduzir um Rosto” acontecerá na próxima semana, entre os dias 10 e 13 de julho. As inscrições são gratuitas, mas as vagas são limitadas.
Quem quiser se inscrever ou obter mais informações, pode entrar em contato.
telefone: 31 3277 8658
email: bpij.fmc@pbh.gov.br