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cep 20.000 comemora 17 anos hoje

para quem estiver no rio: o cep 20.000 comemora hoje os seus 17 anos de poevídeomúsicartinvenção.

endereço novo, anota aí:

teatro do jockey
rua mário ribeiro, 410 (pra quem for de carro)
rua bartolomeu mitre, perto do hospital miguel couto (pra quem for a pé)

hoje, 19 de junho, às 20h.
confira mais detalhes no blogue do chacal: www.chacalog.zip.net

leo gonçalves e juan gelman na unipac

no próximo sábado, dia 16 de junho, estarei na unipac de congonhas, a convite das professoras juliana leal e karla cipreste, para uma conferência-leitura da e sobre a poesia de juan gelman. aproveito para começar a desenvolver uma proposta que venho pensando de unir uma performance poética a uma apresentação conceitual da poesia. vamos ver no que dá.

exílio

aqui/palavra que foi cão

pela cavala que dizia/
já não há nada a fazer/
está a luz/que tanta sombra fez/

por isso você dói tanto/
beleza?/me bate
como se fosse seu irmãozinho?/
boca de seu arrabalde?/

o que é você?/quem é você?/diga-me um pouco?/
já não será daqui quando nos fomos/
nem me deixa tirar a mão
do fogo de não ser/

(do livro isso. unb, 2004)

notas sobre a vanguarda distraída

depois de escrever o post anterior, recebi inúmeros emails, cartas e mensagens de celular me criticando pelo termo criado para designar a poesia do meu amigo. a linha principal da crítica, (a única que acho pertinente) propunha que, sendo vanguarda, ninguém poderia ser distraído. era, portanto, uma contradição em termos. um dos meus críticos mais duros, inclusive, fez questão de ressaltar que numa guerra, a vanguarda exerce um papel essencial: é sempre o primeiro batalhão a enfrentar o inimigo e que portanto ninguém podia estar neste posto distraído.

isso tudo me divertiu muito. e resolvi, como resposta, acrescentar algumas notas:

1. não se trata de contradição. como vocês puderam notar, a poesia do anderson é mordaz e atenta ao melhor do que acontece ao seu redor. alguém terá notado também que a minha geração cresceu sob o poder daquilo que chamam “cultura de massas” ou “entretenimento” (vulgo xuxa, fausto silva, ana maria braga e outros lixos enlatados). vocês não queriam que eu dissesse: “vanguarda entretida”, queriam?

2. jerzy grotowski foi um importante teórico do teatro que nos anos 60 propunha que a ação teatral se fazia graças a uma difícil tensão que ocorre entre o ator e o espectador, sendo que este ocupa um papel opressor por não se ver, na maioria das vezes, preparado para curtir uma peça e sim para consumi-la. no começo dos anos 70, cansado desta tensão, grotowski decidiu abrir mão dela para produzir um teatro total. ao final, ele diz: se vocês quiserem considerar isto teatro ou não, pouco me importa.

grotowski é um precursor da vanguarda distraída.

3. me diverte muito a idéia de que alguém venha a levar a sério o título que dou aos meus contemporâneos (incluindo-me a mim mesmo). onde já se viu… vanguarda distraída.

4. podia escrever um manifesto. até mesmo porque manifestos já estão fora de moda. por isso mesmo. cairia bem.

5. enganam-se redondamente aqueles que (como o frei betto) ficam por aí dizendo que a minha geração só possui alienados despolitizados que só querem fazer parte do sistema mundial de competitividade proposto pelo capital tio sam. o que nós queremos é comer todo mundo. discretamente, como bons mineiros. numa grande mordida de prazer (se o prato for nutritivo) ou num grande bocejo (se o prato só tiver carboidratos – como o frei betto).

6. fico triste de ver como que toda e qualquer subversão é rapidamente assimilada pelo sistema mundial de consumo. che guevara, lenin, leon trotsky, jozef stalin, marilin monroe, john lennon, jim morrison, bob dylan, cicciolina, andy warhol. todo mundo pode ser tranquilamente jogado na mesma lixeira. por outro lado, vejo que o pessoal até que ganha um dinheirinho com isso. o que não é nada mal. contanto que sobre um pouco também para os poetas. um leitinho de vez em quando, as crianças agradecem.

7. para o meu amigo guerrilheiro, com seu papo de inimigos, eu confesso: fui eu que matei paulo leminski. e enquanto agonizava com ar divertido, ele me explicava a doutrina dos epicuristas e me repetia sempre como num refrão: “distraídos venceremos”

apontamentos de arte radical

está lá no karl marx: “ser radical é tomar as coisas pela raiz. E a raiz para o homem, é o próprio homem”. tomar as coisas pela raiz! pois é. depois vieram os marxistas, os esquerdistas entre aspas e cismaram de usar o termo para designar aquelas pessoas que ficam no polo extremo, de um lado ou de outro. mas radical, não me esquecerei nunca, é tomar as coisas pela raiz. e não gosto mais de gostar de nenhum tipo de arte que não seja radical.

estou falando de arte viva. estou falando de makely ka, renato negrão, ricardo aleixo, marcelo terça-nada! e brígida campbell, zé celso martinez corrêa, juan gelman, marina abramovic. porque ninguém vai me convencer que se faz arte para os mortos. que os mortos governam os vivos. nada disso. mas nesse delírio, encontrei uns caras que vão servir de modelo para a minha arte radical. faço questão de colocar o nome deles aqui.

estou falando de oswald de andrade. eu podia simplesmente não concordar com o pirado do haroldo de campos, que escreveu sobre ele um texto chamado “uma poética de radicalidade”. mas o fato é que ele está certo. oswald é o fundador da modernidade no brasil. e como ele já dizia: “só a antropofagia nos une”. é ela que nos torna brasileiros. é ela que nos permite essa constante transformação do tabu em totem.

o outro radical é também um antropófago. só que italiano. pier paolo pasolini. sendo ele italiano, a antropofagia tem outro sentido: ela não o une a nenhum italiano, mas a todos os homens que vêm do terceiro mundo. daí existir uma puta relação entre pasolini e um outro radical: glauber rocha. pasolini era socialista roxo, mas não concordava com as concessões em favor de um autoritarismo primitivo que se faziam sempre os socialistas. então ele se lembra da oréstia, de ésquilo:

você leu a oréstia, de ésquilo? há pouco traduzi a peça. o contraste entre um estado democrático – mesmo que toscamente democrático e o outro tirânico e arcaico. o ápice da trilogia é o momento em que a deusa atena, a razão, institui a assembléia dos cidadãos que julgam com direito a voto. mas a tragédia não acaba aí. depois da intervenção racional de atena, as erínias – forças desenfreadas, arcaicas, instintivas, da natureza – sobrevivem – são deusas, são imortais. não podem ser eliminadas, não podem ser assassinadas. devem ser transformadas, deixando intacta a substancial irracionalidade que as caracteriza, istó é, mudando as “maldições” em “bênçãos”. os marxistas italianos não se propuseram esse problema, e acho que os russos também não.

e eu concordo com o pasolini. mas hoje estou brincando de citar. e cito outro radical genial, nelson rodrigues: “o ser humano só tem salvação se tomar consciência das suas próprias misérias.”

cordel do fogo encantado, joão cabral de melo neto e os bonecos

“o amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. o amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. o amor comeu meus cartões de visita. o amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

joão cabral de melo neto

no último sábado, na praça da estação, a coisa ficou bonita. eu e a patrícia fomos ver o sesi bonecos do brasil. nunca tínhamos visto um show do cordel do fogo encantado e fiquei impressionado. música de qualidade, muita gente bonita, muita dansa, muita poesia e muita alegria tudo junto no mesmo horário e no mesmo lugar.
só um comentário: joão cabral nunca podia imaginar que o poema dele seria falado por uma banda de rock’n roll, em plena praça da estação, pra uma platéia repleta de jovens e adolescentes. saravá lirinha!

o sábia no sertão,
quando canta me comove,
passa três meses cantando
e sem cantar passa nove
porque tem a obrigação
de só cantar quando chove

A fala, o melhor espetáculo

 

“Whorf dizia que a fala é o melhor espetáculo encenado pelo ser humano. (…) É que a fala – mediando, entremeando e trespassando todas as nossas atividades cotidianas, inclusive os delírios oníricos – aqui e ali se configura de modo distinto, notável, superando a visada meramente pragmática da comunicação técnica imediata. São pontos luminosos, cristalizações sígnicas diferenciadas em meio ao conjunto total das condutas verbais. E assim podemos nos aproximar do – e talvez flagrar o – momento em que a palavra poética brota da palavra prática, desenhando um torneio digno de nota pelo arranjo dos elementos que o constituem. Desse ponto de vista, se a fala é o melhor espetáculo encenado pelo ser humano, ela às vezes apresenta um espetáculo dentro do espetáculo: a poesia. Mas não se pode, por outro lado, reduzir o poético ao poema. o poético pode se encarnar num poema tanto quanto no futebol, em tiradas que ressoam nas ruas, no paleio mais inconseqüente. Ou seja: há um espetáculo dentro do espetáculo, mas que não coincide necessariamente com os limites do objeto “poema”. Ele pode repontar em qualquer comportamento lingüístico, embora seja a marca registrada das artes da palavra.

Em suma, esses jogos verbais – e poesia é isto, para desespero dos “conteudistas”: jogo verbal – permeiam a nossa vida.”

 

Antônio Risério em Oriki Orixá.